domingo, 28 de setembro de 2008

CLARO QUE NUNCA HOUVE PRESSÕES



"O Primeiro-Ministro referiu-se sim ao meu editorial sobre a OPA da Sonae e ao caso da licenciatura. Fez uma referência subtil ao facto de ter estabelecido uma boa relação com o Eng. Paulo Azevedo durante a OPA, o que queria dizer: fiquei com uma boa relação com o seu accionista e vamos ver se isto não se altera".

José Manuel Fernandes, director do Público, auto de declarações à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC).


Já cá se sabia que a ERC tinha feito o seu trabalho e sossegado as consciências quanto à feliz inexistência de pressões por parte do Primeiro-Ministro contra a publicação de notícias sobre a sua licenciatura.

Mas vale a pena a leitura dos documentos referentes à instrução desse processo, publicados sete meses depois da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos ter dito que não eram para ficar guardados.

O meu preferido, pela sofisticação semiótica com que decorreu o interrogatório, é o auto de tomada de declarações ao Jornalista Ricardo Dias Felner, de que deixo um pequeno excerto:

" (...) Ricardo Dias Felner: Eu acho que a forma como decorreram essas conversas (telefonemas de José Sócrates) não foi uma forma correcta do PM, ou do Gabinete do PM, se relacionar com os jornalistas.

Estrela Serrano (Erc): Correcta é diferente de ilegítima, não é?

RDF: Não sei.

Azeredo Lopes (Erc): Oh Dr. Felner, não vamos começar aqui com jogos de palavras. É que o correcto...

RDF: Isso é o que vocês querem que eu comente.

AL: Não, não é, faz bem em levantar essa questão, porque isto pode parecer uma insistência. A expressão correcto aponta, ou pode apontar, o Conselho não quer partir de pressupostos, com base nas suas declarações, que sejam injustas em relação ao que quis dizer. Como pode perceber, não é uma questão pequena, o conselho tem que ter o máximo cuidado em não extrapolar, em não analisar, ou tomar como certas, declarações num caso destes. Portanto acredite que eu não estou - e seguramente os meus colegas estão comigo - a tentar que diga alguma coisa, ou que não diga alguma coisa. (...)"

Sobre a ERC propriamente dita qualquer juízo está prejudicado por manifesta inutilidade superveniente. Os melhores são os internos e constam das actas que a investigação do jornal Expresso e a CADA lograram trazer a público.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

O GATO DAS SETE VIDAS FAZ UM ANO


Para o escravizado mordomo de um cão com blog era irresistível tornar-me assíduo do gato. O Petra faz que não gosta, como lhe compete, por isso visito-o às escondidas. A melhor hora é a terceira da madrugada, com o copo de plástico do último bombay da esplanada do miradouro a verter para o teclado. É como entrar numa casa de fado e gostar da música.

O gato é um escritor de canções. Letras longas, feridas fundas, densidade, lucidez e estilo. Uma incarnação improvável de Bruce Springsteen, Tom Waits, Albert Ayler, Chico Buarque e David Byrne. Ele que me desculpe, mas não consegui meter aqui a Mayra Andrade. Estou a sério e julgo ter encontrado a precisão jornalística.

Vi o gato uma vez na vida, na noite de Lisboa. Não me recordo do assunto, mas sei que nos entendemos. Não tem tanto a ver com estar de acordo como com estar-se acordado numa corda de trapézio a que se chama vida. Ele tem sete, por isso salta melhor e mais vezes. Fortuna dele, pequeno prazer de quem o visita, azar de quem o atiça.