Quando vi a entrevista de Manuel Alegre a Mário Crespo também senti que vinham aí notícias gordas. Ou a remodelação do ministro da Saúde, como mínimo, ou uma ruptura intestina de consequências difíceis de prever no partido do Governo, seguramente suficiente para impedir a renovação da maioria absoluta. Mas se é verdade que Ana Jorge é filiada no movimento de Manuel Alegre, também me recordo que o nome dela já havia sido insistentemente falado para a Saúde antes de outras remodelações, anteriores às eleições presidenciais (se a memória não me trai, nas vésperas da primeira nomeação de Correia de Campos, no ocaso do guterrismo).
A vida é assim. Agora também se falava de outros nomes, um deles com muita instistência (Adalberto Campos Fernandes) e não me surpreenderia se quem não passou de assunto de múltiplas conversas, a maioria das quais ao telemóvel, subisse no futuro ao poder. Os ministros são sempre transitórios (o primeiro erro que podem cometer é esquecerem-se disso) e o seu desempenho, pelo menos numa área tão participada socialmente pelos eleitores como a Saúde, depende quase sempre mais das circunstâncias que encontram do que das estratégias políticas com que tenham sonhado até à tomada de posse. Podemos ver nisso uma fragilidade da Democracia, eu inclino-me mais (e neste ponto mudei muito de opinião nos últimos anos) para a possilidade de ser a sua força.
O problema de Ana Jorge é que terá de concordar no discurso tanto como discordar na prática de vários pontos do projecto político para a Saúde que vai encontrar. Não será um dilema fácil, mas nenhum outro ministro teve dilemas simples para resolver. Ana Jorge poderá sempre ler Heráclito, famoso filósofo pré-socrático, à descoberta de operacionalizar o princípio segundo o qual tudo é e não é ao mesmo tempo. Mas talvez seja mais simples e eficaz recorrer à experiência profissional para dar notícias e tomar decisões. A quantos pais comunicou ela coisas difíceis e perante quantos, pelo menos em pensamento, se desculpou pelo que falha nos serviços de saúde? É certo que estes tempos gostam mais de grandes gestores mas talvez ainda não seja crime pensar como uma médica.
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